Circulando o ralo (espiral vazia)

 aqui estou eu
mais um dia cansada 
mais uma vez com o desejo de fugir
só não é maior do que necessidade pela sobrevivência

não quero mais tentar acreditar que faço parte
desse habitat insalubre que tantos se adaptam 
sem esperança alguma de mudança no astral dos futuros dias

o conforto na convivência
não por ser vaziamente cômodo
mas por ser bom de verdade
esse já foi tempo

por isso nunca se entregue sem pensar 
deixe esfriar
deixe ver por detrás das máscaras
nunca confie de primeira
há mais pessoas que querem mais que sejamos como elas preferem
do que como você se sente mais à vontade
não adianta negar a máxima: eles não se importam
enquanto aqui sentimos pela dor de outrem
e as nossas próprias implosões
com o comando de durante o dia desligar a parte humana 
para que a mecânica possa substituir
como se fossemos de fato meros robôs humanizados

é uma espiral sem fim
e vamos girando e girando
encontrando somente a loucura 
ou a fuga 

o cheiro de jasmins trazem prazer,
dos menores, os melhores,
durante o caminho
por mais coisas que despertem e anestesiem ao mesmo tempo

um jardim de dores só se faz regando
as que já fizeram casa anteriormente daquele espaço
e por tantas vezes a culpa não é de quem cede 
mas de quem percebe e deixa por permanecer do mesmo jeito
apenas mais um circulando o ralo para se juntar a tantos iguais meios e finais
na mesma agonia|
na mesma alegria, fingida

após mais um dia sem vontade de continuar ali
mais um dia presa sem ação
gritando por dentro com todo meu diafragma
perto de deixar transparecer
 
o que você quer de mim?
já não estou dando tudo o que tenho?
me responda apenas
quando será o bastante?
porque estou verdadeiramente cansada de toda essa fachada
da inconsciência
do teatro
da permissão para que sejamos apenas menos do que podemos

a verdade é perigosa
afinal o resultado é na direção oposta
mais revelações, mais rebeliões
está claro o por quê de não abrirem os portões
imagina poder ser controladamente descontrolado
completo dono de si
não depender de nenhuma recompensa mal paga
 que venha de quem só fica boiando na própria superfície
dando ordens para os que afundam
imagina apenas poder sentir o sabor da real liberdade

o cômodo parece mais confortável quando é tudo que se conhece
e o medo de tentar algo melhor e diferente quando imposto com tanta veemência

na espiral mais vazia de todas
muitos continuam
acostumados com dores que poderiam não ser sentidas por tantos dias
ou anos seguidos

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